4/29/2011

David Lapoujade: O CORPO QUE NÃO AGUENTA MAIS



Por David Lapoujade


Tradução: Tiago Seixas Themudo


“Naquele momento, na impossibilidade material de ir mais longe, eu teria sido obrigado a deter-me, sem dúvida, pronto, a rigor, para voltar a partir em sentido inverso, imediatamente ou muito mais tarde, quando, de algum modo, eu me desatarraxasse de mim mesmo depois de ter-me bloqueado. Isso teria constituído uma experiência rica em interesse e novidade, se é verdade, como fui levado a dizer sem que pudesse fazê-lo de outro modo, que mesmo o mais pálido caminho comporta um andamento totalmente distinto, uma outra palidez, tanto ao retornar quanto ao ir, e inversamente. Inútil tergiversar, sei um monte de coisas”. (Beckett)

Evidentemente, a questão “que pode o corpo?”, se refere não à atividade do corpo, mas à sua potência. É uma questão estranha, em certo sentido, pois aquilo que pode o corpo se mede geralmente pela sua maior ou menor atividade, pelos atos que é capaz. E, todavia, parece que a questão visa outra coisa: ela visa a potência do corpo em si mesma, independente do ato pelo qual se exprime. Mas, podemos interrogar a potência do corpo sem invocar o ato que exprimirá esta potência? Como não examinar a questão a partir da distinção aristotélica clássica entre a potência e o ato? Segundo esta concepção, a potência é concebida como um ato virtual ou possível, e o ato, por sua vez, é concebido como uma potência atualizada, quer dizer, como uma forma determinada. Como se sabe, esta primeira distinção recorta uma outra distinção fundamental de Aristóteles: a distinção entre a matéria e a forma, a matéria como simples potência e a forma como ato puro. Mas isto quer dizer que o ato não tem nenhuma eficácia por si mesmo, pois não passa de uma forma. É necessário, portanto, um terceiro termo que aja a forma na matéria: tal termo será o agente. É o que ilustra o exemplo clássico do artesão, do oleiro que age a forma do vaso na matéria da argila, ou o do atleta, que age o ato da corrida em um corpo que possui a potência. Consequentemente, é depois do ato, ou melhor, depois do agente, que a potência é revelada como tal. Neste sentido, a questão sobre a potencial do corpo parece inseparável de uma resposta que afirma de direito a superioridade do ato – e, portanto, do agente – em relação à potência do corpo.

Todavia, em oposição a esta concepção, há um Fato que, “nós modernos”, devemos sempre nos lembrar, e que também pode ser uma resposta. Esse fato, é que o corpo não aguenta mais. Não se trata nem de um postulado nem de uma tese, mas de um fato. Basta considerar, por exemplo, o domínio da arte hoje em dia, onde se multiplicam as posturas elementares: sentado, esticado, inclinado, imobilizado, os dançarinos que escorregam, os corpos que caem ou se torcem, que se mutilam, que gritam, os corpos desacelerados, adormecidos. 1

Somos como personagens de Beckett, para os quais já é difícil andar de bicicleta, depois, difícil de andar, depois, difícil de simplesmente se arrastar, e depois ainda, de permanecer sentado. Como não se mexer, ou então, como se mexer só um pouquinho para não ter, se possível, que mexer durante um longo tempo? É, sem dúvida, o problema central dos personagens de Beckett, uma das grandes obras sobre os movimentos dos corpos, movimentos de si e entre os corpos. Mesmo nas situações cada vez mais elementares, que exigem cada vez menos esforço, o corpo não aguenta mais. Tudo se passa como se ele não pudesse mais agir, não pudesse mais responder ao ato da forma, como se o agente não tivesse mais controle sobre ele. Os corpos não se formam mais, mas cedem progressivamente a toda sorte de deformações. Eles não conseguem mais ficar em pé nem ser atléticos. Eles serpenteiam, se arrastam. Eles gritam, gemem, se agitam em todas as direções, mas não são mais agidos por atos ou formas. É como se tocássemos a própria definição do corpo: o corpo é aquele que não aguenta mais, aquele que não se ergue mais.

De fato, embora aquilo que designamos sob o nome de Fato, na ausência de um nome melhor, pareça “moderno”, é evidente que é desde sempre que o corpo não aguenta mais. Heidegger dizia: “aquilo que mais dá o que pensar é que nós ainda não pensamos”, para dizer que é desde sempre, e para sempre, que nós ainda não pensamos 2 Ele via aí uma das condições do pensamento. Da mesma maneira, no momento em que se descobre que não se aguenta mais, se descobre, ao mesmo tempo, que é desde sempre e para sempre.

Parodiando Heidegger, seria preciso dizer aqui: aquilo que no corpo mais se faz sentir (mais dá o que sentir), é que nós não agüentamos mais. É a condição mesma do corpo. Não irá mais erguer-se. Dito de outra maneira, o corpo não pode erguer-se de sua condição de ser corpo. Nestas circunstancias, colocar a questão: “que pode o corpo?”, quando sabemos desde sempre que não aguentamos mais, parece um pouco deslocada. Esta afinidade entre o “Eu não aguento mais” do corpo e o “Nós ainda não pensamos” do pensamento, é implicitamente sublinhada por Deleuze quando diz, por exemplo, que “pensar é apreender aquilo que pode o corpo não pensante, sua capacidade, suas atitudes ou posturas”. E acrescenta: “O corpo não está jamais no presente; ele contém o antes e o depois, o cansaço, a espera. O cansaço, a espera, mesmo o desespero, são as atitudes do corpo”3. A impotência (L’impouvoir) do pensamento é como o avesso da impotência do corpo. Seria como as duas fórmulas nas quais se misturam Espinosa e uma inspiração heideggeriana: “nós não sabemos o que pode o corpo” e “o corpo não aguenta mais”.

Pois o campo filosófico não é, evidentemente, poupado por este desmoronamento do corpo: vejam as descrições de Foucault, os corpos doentes e dissecados do Nascimento da clínica, ou a descrição do corpo supliciado de Damien que abre Vigiar e punir. Vejam as descrições do corpo masoquista ou os corpos deformados das pinturas de Bacon, tal como as descreve Deleuze: “... as deformações de Bacon são raramente compelidas ou forcadas, não são torturas, apesar do que se diga: ao contrário, são as posturas mais naturais de um corpo que se reagrupa em função da força simples que se exerce sobre ele: vontade de dormir, de vomitar, de se revirar, de ficar sentado o maior tempo possível... etc.” 4

Mesmo em suas funções mais elementares, parece que, de agora em diante, o corpo só pode aparecer diminuído, deformado, no limite da impotência. Tudo se passa como se o corpo não tivesse mais agente para fazê-lo ficar direito, organizado ou ativo. Não se pode falar aqui da potência do corpo justamente porque o corpo não aguenta mais. A menos que se trate de outra coisa: será preciso, talvez, aceder a outra definição da potência? Pois é evidente que todos estes corpos são dotados de uma estranha potência, mesmo no esmagamento,uma potência sem dúvida superior àquela da atividade do agente. Talvez, então, seja preciso conceber uma potência que não se define mais em função do ato final que a exprime, uma concepção não-aristotélica da potência. E isto significa encontrar uma potência própria ao corpo, uma potência liberada do ato.

“Eles me mataram mesmo, ao me deixarem ouvir que, não mais podendo, eu não teria outro recurso senão desaparecer. Não mais podendo! Seria preciso um segundo para fazer-me suportar, após o quê eu manteria por toda a eternidade os dedos no nariz. Que foram eles buscar como golpes duros”.(Beckett)

Mas antes de determinar essa nova potência, uma primeira questão se impõe: o que o corpo não aguenta mais (o que é que o corpo não aguenta mais)? Qual é essa impotência quase-imemorial que parece confundir-se com sua própria condição? A resposta é dupla. Primeiro, ele não aguenta mais aquilo a que o submetemos do exterior, formas que o agem do exterior. Essas formas são, evidentemente, as do adestramento e da disciplina. As páginas essenciais de Nietzsche, em A genealogia da moral, ou as descrições de Foucault, em Vigiar e punir, são decisivas a este respeito: trata-se de formar corpos e de engendrar um agente que submeta o corpo a uma autodisciplina. Em Nietzsche, é um corpo animal (que é preciso adestrar) e, em Foucault, um corpo anômalo (que é preciso disciplinar). E, através das páginas esplêndidas de Nietzsche e Foucault, é todo um sistema da crueldade que se impõe aos corpos. A crueldade não se confunde como a abominação da tortura, se bem que ambas interroguem um aspecto profundo do corpo: sua potência de resistir, sua resistência ao cansaço e ao sofrimento. Ambas questionam: o que o corpo pode suportar?

E se as páginas consagradas ao sofrimento dos corpos parecem atravessadas por uma força cômica, é porque, talvez, façam sentir a discreta alegria de um corpo que possui, pelo menos, esta potência de resistir. Talvez reencontremos este aspecto na descrição que Deleuze faz da vergonha: “A idéia de que apesar de tudo o horror tem um fim vem de que a lama molecular é o último estado do corpo e de que o espírito o contempla com uma certa atração, porque nele encontra a segurança de um último nível que não se pode ultrapassar” 5.

Diremo-nos, talvez, que não aguentar mais é o signo de que não resistiremos por muito mais tempo. Ao contrário, se como dissemos, é desde sempre e para sempre que não aguentamos mais, se é desde sempre e para sempre que resistimos, então esta resistência é um profundo fortalecimento a constante de um limite ou de um “último nível”.

Todavia, não é menos evidente que o corpo não aguenta mais também aquilo a que se submete de dentro. Pois estas mesmas formas passam para dentro, se impõem ao dentro desde que se cria um agente para as agir. Neste instante, a relação muda a natureza; ela deixa de questionar a resistência do corpo no adestramento e o transforma em assujeitamento. Como diz Nietzsche, ela lhe cria uma alma: “Todos os instintos que não se liberam para o exterior, se voltam para dentro – é o que chamamos de interiorização do homem: eis a origem do que chamaremos mais tarde de sua “alma”. Todo este mundo do interior, tão frágil originariamente, tendido entre duas peles, se desenvolveu, se amplificou, adquirindo profundidade, largura, altura, na medida em que se impedia o homem de se liberar para o exterior” 6.

Vemos precisamente o que ocorre: é entravando a potência dos instintos, voltando-os contra eles mesmos, que se pode criar uma alma que se tornará o agente dessa interiorização. Mas se Nietzsche mostra como se cria uma alma para o corpo, Deleuze e Guattari mostram, inversamente, como se cria um corpo para esta alma. Seguindo uma inspiração de Artaud, eles sublinham justamente que o agente constrói no corpo um organismo que pode subordiná-lo: “O juízo de Deus, o sistema do juízo de Deus, o sistema teológico, é precisamente a operação Daquele que faz um organismo, uma organização de órgãos que se chama organismo [...]. Você será organizado, você será um organismo, articulará seu corpo – senão você será um depravado [...]. Você será sujeito e, como tal, fixado, sujeito de enunciação rebatido sobre um sujeito de enunciado – senão você será apenas um vagabundo” 7.

Reencontramos aqui dois domínios onde a potência do corpo está submetida aos atos do agente que nele se forma: organização e subjetivação. É na sua resistência a estas formas vindas de fora, e que se impõe ao dentro para organizá-lo e lhe impor uma “alma”, que o corpo exprime uma potência própria. O corpo sofre de um “sujeito” que o age – que o organiza e o subjetiva. Em outros termos, trata-se não apenas de tornar doente nosso corpo, mas de nos tornar doentes dessa doença, como se doença devesse se redobrar em nós. Assim é o sistema do juízo de Deus, seguindo a fórmula que Deleuze e Guattari emprestam de Artaud. Pois a verdadeira doença não é estar doente, mas, na cura, possuir remédios que pertencem ainda à doença 8.

Que o corpo se organize e se subjetive sob a autoridade do sistema do juízo, Nietzsche o mostra quando descreve a maneira como o padre judeu, e depois o padre cristão, transformaram a dor em doença, e a doença em mal. Transformar a doença em mal é o seu remédio, mas um remédio que pertence à doença, que a reforça para torná-la coextensiva à vida. A religião tem por função essencial fazer da doença a condição da vida. Como sublinha Bárbara Stiegler, em um profundo estudo sobre Nietzsche e a biologia, a religião “interpreta a dor como mal e nos torna doentes de nosso sofrimento. O padre responde àquele que sofre: tu sofres porque tu és culpado (tu te sentes mal porque o mal está em ti) e tu deves continuar a sofrer para te punires (por teres este mal em ti)” 9.

A invenção da culpa nos Cristãos tem por objetivo tornar o doente ainda mais doente. Tudo é pensado no cristianismo a partir do corpo mártir que toma sobre si os sofrimentos sem nenhuma reação nem exteriorização, mesmo que adiada. Desde então, o sofrimento se torna sacerdócio, missão, fardo. O cristo é o homem doente, cercado de doentes compadecido 10. É a revelação tardia conhecida pelo Cristo de D. H. Lawrence diante da sacerdotisa egípcia: “Eu pedia a todos que me servissem com o cadáver de seu amor. E no final ofereci-lhes apenas o cadáver do meu amor. Este é meu corpo... tomai e comei... meu cadáver... Fui morto, e me entreguei à morte... “11. Da cruz como mesa de dissecação. Tudo se passa como se nem Judas nem Roma tivessem matado Jesus, mas sim seus primeiros fiéis, quer dizer, em suma, o cristianismo vindouro. Jesus é a primeira vítima do sistema do juízo cristão. Tudo culmina, portanto, segundo a expressão de Lawrence, em uma “doença da morte”.

“Mas a época da qual falo acabou com esta vida ativa, não me agito nem me agitarei jamais, a menos que seja sob o impulso deum terceiro. Com efeito, do grande viajante que fui, de joelhos nos últimos tempos, depois arrastando e rolando, resta tão-somente o tronco (em miserável estado) encimado pela cabeça que se conhece, eis à parte de mim cuja descrição eu apreendi e retive melhor. Embora eu não ande exatamente na linha, a polícia me tolera” (Beckett)

Parece-me, portanto, que o corpo, longe do sistema da crueldade próprio ao adestramento, só pode escolher entre uma doença (que assume a forma do ressentimento)12 e uma anestesia que é seu inverso, a “narcose” de que fala Nietzsche a respeito do cristianismo. A vida como interminável neurastenia, quando a felicidade se torna “essencialmente narcose, engorda, repouso, paz, “sabat”, alívio da alma e relaxamento do corpo, ou seja, passividade”13.

Conservar e redobrar o sofrimento na doença, ou então se tornar insensível, “anestésico”. Tornar a vida doente ou desvitalizá-la: eis as alternativas que, nos dois casos, retiram toda potência do corpo e a transferem ao agente, a uma “alma” que não passa, finalmente, de um sintoma dessa doença durável. E frequentemente as duas se associam; é ao mesmo tempo em que se está doente da vida e insensível a seus próprios sofrimentos. E é justamente este o paradoxo: tornar a vida doente para separá-la do sofrimento. Todo o problema consiste, então, em encontrar uma saúde no sofrimento: ser sensível ao sofrimento do corpo sem adoecer. Parece-me ser a mesma questão em Nietzsche e em Deleuze: que o sofrimento não seja mais uma doença, que ele se torne um meio para a saúde (não médica) e para a salvação (não-teológica). Para isso, é preciso tornar a partir da questão do sofrimento e perguntar mais uma vez: que pode o corpo? O que é o corpo que sofre?

A primeira coisa, é que o sofrimento não é um estado particular do corpo. Sofrer é a condição primeira do corpo. Sofrer é a condição de estar exposto ao fora. Um corpo sofre de sua exposição à novidade do fora, ou seja, ele sofre de ser afetado. Como diz Deleuze, um corpo não cessa de ser submetido à erupção contínua de encontros, encontro com a luz, com o oxigênio, com os alimentos, com os sons e palavras cortantes etc. Um corpo é primeiramente encontro com outros corpos. Compreende-se porque Deleuze define a sensação como uma síntese passiva pela qual o corpo encontra forças agindo sobre ele. É a própria diferença, o desigual ou o desequilíbrio da própria diferença, a repartição de singularidades no seio de um corpo que mal as suporta, que cria seu equilíbrio a partir deste Desigual. Para retomar os termos de Nietzsche, também podemos dizer que o corpo é “originariamente o sofrimento da impressão e o reconhecimento de uma potência estrangeira” 14.

E, como lembra Bárbara Stiegler, Nietzsche estudará de perto os biólogos de sua época que definiam a vida como irritação ou excitação, quer dizer, não como espontaneamente ativa, mas originariamente passiva. Pode-se dizer que as filosofias de Nietzsche e Deleuze são filosofias da alegria, da afirmação, mas isso é inseparável de uma patologia do corpo, do afrontamento de um fora que assimilamos e do qual nos tornamos senhores (Nietzsche) ou que tentamos igualar envolvendo-o (Deleuze). Há uma patologia originária, uma passividade primeira e fundamental do corpo. Dito de outra forma, a questão: que pode o corpo? só é possível e só faz sentido a partir desse sofrimento primeiro. O cristianismo sabe bem quem nos torna doentes de não agir este sofrimento. Pois a questão é: que pode o corpo em face desse sofrimento que é sua própria condição? Ou se preferirmos: como um corpo devém ativo? A primeira condição, como já vimos, consiste em sentir este sofrimento, o “Eu sinto” que é um “Eu não aguento mais”, pois esta exposição ao fora é insuportável. O corpo deve primeiro suportar o insuportável, viver o inviável. É o sentido do corpo-sem-órgãos em Deleuze: que o corpo passe por estados de torção, de dobramentos que um organismo desenvolvido não suportaria 15. Todos os textos sobre o Corpo-sem-órgãos são, no fundo, textos de embriologia. Há em Deleuze uma verdadeira embriologia transcedental: o corpo como ovo. 16 Como suportar, então, o insuportável, como viver o inviável (quer dizer, como criar para si um Corpo-sem-órgãos?), o que significa, evidentemente, uma outra maneira de perguntar: que pode o corpo?

A resposta é dupla: 

Desde já, é evidente que o corpo deve montar mecanismos de defesa. É o nascimento da dor em Nietzsche 17 Nós interpretamos defensivamente estas exposições como dores. “A excitação mais violenta não é em si mesma uma dor: mas neste movimento que sentimos, o centro nervoso projeta a dor até o lugar da excitação. Esta projeção é uma medida defensiva e de projeção”4.

Nosso corpo se protege contra os ferimentos que sofre, tanto pela fuga, pela insensibilidade, como pela imobilização (fingir-se de morto), ou seja, por processos de fechamento, de enclausuramento. O corpo não pode mais suportar certas exposições (tornar-se imperceptível, em Deleuze, participa desses mecanismos de defesa). De certa maneira, reencontramos aqui a resistência ou o embrutecimento que o corpo manifesta contra os mecanismos de adestramento. Mas estes inseparáveis processos de defesa contra o sofrimento devem ser inseparáveis de uma exposição ao sofrimento, que aumenta a potência de agir dos corpos. Nietzsche diz que sofremos excitações. Mas como diz Bárbara Stiegler, “as excitações de que fala Nietzsche não são objetos que controlamos, que nos deixam indenes. São ferimentos que nos afetam no mais fundo de nós mesmos e que nos dão nossa potência de assimilação.” Ela cita, em seguida, um texto muito importante de Nietzsche: “Crescimento da potência lá onde houve abundância de feridas mais sutis, através das quais aumenta a necessidade de apropriação” 19.

A apropriação vem do fato de que o corpo não suporta a ferida, de que ele não aguenta mais. A potência do corpo (aquilo que ele pode) se mede pela sua exposição aos sofrimentos ou às feridas. Mas Nietzsche diz: as feridas são as mais sutis. Isto quer dizer que a exposição do corpo se faz no interior dos mecanismos de defesa... e que o protegem das feridas mais grosseiras. Sutil, aqui, não suficientemente para que eu tenha acesso à profundeza e à violência de uma ferida sutil – ou, inversamente, que eu tenha acesso à sutileza que esconde uma ferida grosseira. “Você é muito grosseiro a meu ver: você não sabe desaparecer vivendo pequenas experiências” 20.

Aquele que vê na ferida sutil algo sem importância é precisamente aquele que já não sente nada, “que erigiu um sistema de defesa que o impede de apreender a variedade de afecções, reduzindo-as a uma resposta uniforme.” 21 É aquele que nos envia sempre às feridas mais grosseiras, ironizando a sutileza de nossas feridas, a nossa enorme sensibilidade ou delicadeza, dizendo que não é grande coisa, que há coisas mais sérias na vida. É aí justamente que se exerce a força dos fracos, daqueles que sentem o menos possível, pois já se separaram de sua sensibilidade, ainda piedosos.

Aqui é preciso seguir o que diz Bárbara Stiegler sobre o paradoxo da fraqueza do forte. O que faz a fraqueza do forte é que ele se esforça para perseverar, e mesmo aumentar, sua vulnerabilidade, controlando seu grau de exposição às feridas do fora; se protegendo das agressões mais grosseiras, ele pode se abrir às feridas mais sutis. “Se defender do que é estrangeiro, não deixar agir a excitação como uma força formadora, lhe opor uma pele dura, um sentimento hostil: para a maioria essa é uma necessidade vital para sua conservação. Mas no domínio moral, a livre amplitude da vista atinge seu limite lá onde não sentimos mais a excitação estrangeira como uma excitação estimulante, mas apenas como um prejuízo.” ²²
E este movimento se encontra em Deleuze, talvez acrescido: seu estoicismo exige que estejamos à altura do acontecimento. É preciso igualar o desigual da diferença (o que não quer dizer igualá-lo), igualar o que nos acontece. É esta toda a questão: como estar à altura do mais sutil ou do mais baixo, à altura do protoplasma ou do embrião, estar à altura de seu cansaço ao invés de ultrapassá-lo em um endurecimento voluntarista, ou seja, estar à altura do Corpo-sem-órgãos, embrião ou larva.

Ser forte consiste primeiro em estar à altura de sua fraqueza. “Só se cavam espaços, só se precipitam ou desaceleram tempos à custa de torções e deslocamentos que mobilizam e comprometem todo o corpo... Portanto, há sem dúvida atores e sujeitos, mas são larvas, porque são os únicos capazes de suportar os traçados, os deslizamentos e rotações... E é verdade que toda Idéia nos faz larvas... As larvas trazem as Idéias em sua carne...”²³ Não se trata mais de se fazer sujeito ou “agente”, mas, ao contrário, de re-devir “larva” seguindo uma estranha involução criadora reclamada por Deleuze. Nos encontramos aqui diante de um corpo sem agente.

Não saímos ainda do paradoxo inicial: de um lado, um “Eu não aguento mais” (tudo aquilo de que devo me defender, daquilo que meu corpo sofre e me faz sofrer), do outro, um “Eu sinto (no sentido em que nos abrimos a tudo aquilo que advém sob o regime do sutil). Se fechar para se abrir é o paradoxo da prudência, enunciado por Nietzsche e Deleuze. Mas este paradoxo é primeiramente o paradoxo da relação entre nossa receptividade e nossa espontaneidade que, juntas e inseparavelmente, testemunham aquilo que pode o corpo. É o próprio daqueles a quem Nietzsche chama de homens superiores: “Os homens superiores são os que mais sofrem com a existência – mas possuem também as maiores forças de resistência.” 24

O “eu não aguento mais” não é, portanto, o signo de uma fraqueza da potência, mas exprime, ao contrário, a potência de resistir do corpo. Cair, ficar deitado, bambolear, rastejar são atos de resistência. É a razão pela qual toda doença do corpo é, ao mesmo tempo, a doença de ser agido, a doença de ter uma alma-sujeito, não necessariamente a nossa, que age nosso corpo e o submete às suas formas.


“Ei, é uma idéia, mais uma, talvez à golpes de mutilações, eu quase chegaria, daqui a uma quinzena de gerações de homens, a me figurar entre os passantes” (Beckett)


As citações de Beckett foram gentilmente traduzidas por Luiz Orlandi.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


1. Ver as descrições de C. JACQUET em Le corps, PUF, 2001, sobretudo as descrições do trabalho de performance corporal de Abramovic.

2. Qu’appelle-t-on penser(int), Paris, PUF, p.22.

3. DELEUZE, Gilles. L’image-temps. Paris, Minuit, cap.8, p.246.

4. DELEUZE. Francis Bacon. Logique de la sensation. Paris: Éditions de la Difference, 1981, p.41.

5. DELEUZE, G. Crítica e clínica. São Paulo, Ed. 34, 1997, p.140.

6. NIETZSCHE, F. A Généalogie de la morale, II - 16.

7. DELEUZE, G. & GUATTARI, F. Mil Platôs, vol 3, São Paulo, Ed. 34, 1996, p. 21-22. Deleuze e Guattari invocam uma terceira forma de assujeitamento do corpo: a interpretação.

8. É o que já dizia Nietzsche quando analisava o caso Sócrates em O crepúsculo dos ídolos, “O problema de Sócrates”, Rio de Janeiro, Relume Dumará, 2000, p. 23, “Imaginar a possibilidade de escapar da décadance através do estabelecimento de uma guerra contra ela é já um modo de iludir a si mesmo criado pelos filósofos e moralistas. O escape está além de suas forças: o que eles escolhem como meio, como salvação, não é senão uma nova expressão da décadance.”

9. Bárbara Stiegler. Nietzsche et la biologie. Paris, PUF, col. “Philosophies”, 2001, p.117. As análises que fazemos de Nietzsche, assim como certas citações que utilizamos, devem muito a esta admirável obra.

10. D. H. LAWRENCEL. O homem que morreu, In: Apocalipse, Cia. das letras, São Paulo, 1990. As palavras do Cristo de Lawrence sobre seus discípulos: “Tentei compeli-los a viver, por isso eles me compeliram a morrer. É sempre este o efeito da compulsão.” (p. 142)

11. D. H. LAWRENCEL. Idem., p. 166-168.

12. Cf. A importante frase de Nietzsche em Ecce homo, - 6: “Estar doente é já uma espécie de ressentimento”.

13. La Genealogia de la morae, I, - 10.

14. STIEGLER, Stiegler, idem., p.36.

15. Cf. Diferença e repetição. Trad. Luiz Orlandi e Roberto Machado. Graal, Rio de Janeiro, 1988, cap. IV, p. 207. “As proezas e o destino do embrião consistem em viver o inviável como tal, a amplitude de movimentos forçados, por exemplo, que quebrariam todo o esqueleto ou romperiam os ligamentos.

16. Neste sentido, a descoberta do corpo-sem-órgãos já está presente nos textos sobre o embrião em Diferença e repetição, especialmente nas páginas 283-284 da edição francesa.

17. Sobre este ponto, STIEGLER, p. 35-36, e FRANK, Didier a importante análise da cócegas em Nietzsche, Nietzsche et l’ombre de Dieu. Paris, PUF, 1998, p.202-207.

18. STIEGLER. Idem. IBID.

19. Idem. p. 72. Trata-se do FP 1883, 7, [95].

20. Fragmentos póstumos, vol. IX 1882-1884, 5[1] 253.

21. STIEGLER. Idem., p.105.

22. Citado por Bárbara Stiegler, p. 40. Trata-se do FP 1883, 7 [195].

23. Diferença e repetição, IV, p. 211.

24. Fragmentos póstumos, vol. X, p. 67.


4/19/2011

DUAS DOSES DE CIORAN



Por Marco Lucchesi

Uma noite fria no Café Kapsa em Bucareste. O escritor Marin Mincu desenha suas ideias para o centenário de nascimento de Cioran, com algumas cartas do filósofo nas mãos. Um copo de tsúica e Mincu insiste na matriz romena de Cioran e do diálogo deste com Ionescu e Eliade. Mas também Constantin Noica, das “Seis doenças do espírito contemporâneo”, Alexandru Dragomir, discípulo dileto de Heidegger, e do profundo e incontornável Lucian Blaga. Parecia fundamental atingir os fantasmas romenos que habitam as ruínas de Cioran, cuja obra está ganhando reedição, com dois títulos chegando às livrarias na próxima semana: “Breviário de decomposição” e “História e utopia”.
Nascido em abril de 1911 em Rasinari, no sul da Transilvânia, Cioran alcança uma sólida formação literária e filosófica em Bucareste e na Alemanha. Segue depois para a França, em cuja língua passa a escrever desde então (esse idioma emprestado, com suas palavras sutis, carregadas de fadiga e pudor) deixando atrás de si uma importante bibliografia em língua romena.
Não se enganava Marin Mincu: há em Cioran um cerrado confronto metafísico na esfera do trágico, em seu diálogo com Eliade e Botta, uma espessa dialética vizinha ao pensamento de Blaga. E certamente Nietzsche, Schopenhauer, Dostoievski. A educação filosófica de Cioran, além de longitudinal, revela-se altamente articulada. Cosmopolita e de raiz. No fim da vida, reconhece uma herança de fundo gnóstico e de velha cepa, que remonta à cultura dos Balcãs: “por mais que desejasse libertar-me de minhas origens não consegui. Ninguém alcança libertar-se de si mesmo.”
Na história das formas breves, que dominaram o século XX, Cioran ocupa lugar de destaque. Disse de si mesmo que era um homem do aforismo. Seus fragmentos — como os cristais das “Banalidades”, de Dragomir, ou os grumos do “Tractatus”, de Wittgenstein — respiram uma condensada história da filosofia. Não passam de esplêndidas ruínas, náufragas de sua perdida glória — arrancadas de extensas passagens reflexivas, mediante o martelo filosófico de Nietzsche: ruínas sempre, cheias de um brilho feroz, varadas pela sinergia das coisas incompletas e, por causa disso, fortemente potenciais.
Cioran não espera o socorro de um horizonte conceitual devastado, através de uma possível solução totalizadora, nem clama por um anjo capaz de preencher lacunas, ou de soprar, com sua trompa dourada, a melodia de um todo esquecido. Ao contrário, o filósofo ilumina a tensão de um pensamento propositadamente aerado ou disperso e advoga, como ninguém, a volúpia do insolúvel: “nunca tentei aplainar, reunir ou conciliar o irreconciliável”. Uma poderosa nuvem de fragmentos, portadora de uma tensão efervescente, jamais um sistema pronto e acabado. Daí sua inclinação pelas cartas de Nietzsche, onde brilha um discurso impreciso e tateante, fora do profético ou do absoluto de Zaratustra, diante de quem Cioran já não vibrava como outrora.
O programa desse não-programa surge com o ensaio “Uma forma especial de ceticismo”, quando o jovem filósofo romeno dos anos 1930 aposta no excesso da dúvida: “o valor do cético na antiguidade media-se a partir da tranquilidade da alma. Porque não deveríamos criar, nós, que vivemos a agonia da modernidade, um ethos trágico, onde a dúvida e o desespero se confundissem com a paixão, com a chama interior, num jogo estranho e paradoxal?”.
Para alguns estudiosos, aquele paradoxo levou o filósofo a atingir as afecções e as tonalidades emotivas da alma, assumindo um lirismo mitigado e uma inquietação irreversível, isenta de paz, sob uma ótica lúcida, diante do paroxismo das coisas que nos cercam. Não havendo salvação no plano da história ou da metafísica.
Nesse vasto percurso, como em “Silogismos da amargura” ou “História e utopia”, a dimensão do devir e a reserva de esperança deixam de fazer sentido na filosofia da história, nos modelos de Hegel ou Marx, para não falar das teologias da história, igualmente anódinas e ilusórias. “Há mais honestidade e rigor nas ciências ocultas do que nas filosofias que atribuem um sentido à história”. Cioran foge das grandes $ínteses em que o sujeito se afoga nos mares perigosos da abstração.
Nada se pode esperar. Nada se pode oferecer aos altares vazios da história e da utopia. Acabou o tempo em que os faraós inscreviam seu nome nas rochas do tempo. Para Cioran os ciganos são o verdadeiro povo eleito: “triunfaram do mundo por sua vontade de não fundar nada nele.”
Aqui está todo um sentimento. Mais que um programa ou sistema. Cioran vive. Porque não reúne ou aplaina. Não organiza ou completa. Dissolve. Apenas dissolve. E não corre poucos riscos aquele que dissolve. Como quando afirma que “as únicas utopias legíveis são as falsas, as que escritas por jogo, diversão ou misantropia, prefiguram ou evocam as ‘Viagens de Gulliver’, bíblia do homem desenganado, quintessência de visões não quiméricas, utopia sem esperança. Através de seus sarcasmos, Swift varreu a estupidez de um gênero até quase anulá-lo”. O que nos resta fazer, afinal, senão dissolver a tessitura da utopia, desfibrar-lhe os pontos de sua trama, purificá-la dos últimos resíduos de moralina? A utopia e o Apocalipse formam como que a dupla face dos tempos que correm. Ambos se contaminam mutuamente, criando, assim, um modo novo e terrível, capaz de bem traduzir o nosso inferno, ao qual havemos de responder com um sim, correto e desprovido de ilusão. Irrepreensíveis diante da fatalidade.
Cabe ressaltar ainda a boa tradução de José Thomaz Brum do pensamento de Cioran, com quem se correspondia em 1991, quando lhe publicou o primeiro livro no Brasil — “Silogismos da amargura” — alterando inclusive trechos do original, a pedido do próprio autor. Dentre outros estudos de Brum, sublinho “O pessimismo e suas vontades: Schopenhauer e Nietzsche” — tese de doutorado defendida em Nice e orientada por Clément Rosset. O que nos diz da forte ligação do tradutor com a sagrada família a que de algum modo pertence, sem de todo pertencer, o inclassificável Cioran.
Tiro de “Breviário de decomposição” o seguinte fragmento: “Uma caverna infinitesimal boceja em cada célula... meu sangue se desintegra quando os brotos se abrem, quando o pássaro floresce. Invejo os loucos sem remédio, os invernos do urso, a secura do sábio, trocaria por seu torpor minha agitação de assassino difuso que sonha crimes além do sangue.”
Um assassino difuso para conter a febre das utopias e o delírio da história. Eis a tarefa de Cioran, que não hesitaria subscrever o poema “Autorretrato”, do romeno Nichita Stanescu sobre o precário da humana condição: “Sou apenas uma mancha de sangue que fala”.


Publicado originalmente em O GLOBO:
http://oglobo.globo.com/blogs/prosa/posts/2011/04/16/duas-doses-de-cioran-por-marco-lucchesi-375098.asp


4/12/2011

ENTREVISTA COM LUIZ ROBERTO GUEDES


Belíssima entrevista:
Criativo, jogador, pop literatura /
É a escrita literária em fluxos de intensidades:
A alegria pagâ





4/09/2011

Peter Pál Pelbart / Aqui Dentro Aqui Fora



Ouça  na íntegra a palestra Peter Pál Pelbart  no ciclo  de palestras: O Indivíduo , o Movimento e a Cidade - parte da pesquisa do projeto  AQUI DENTRO AQUI FORA.


http://www.opovoempe.org/?page_id=380


Com Google Chrome / Ouça / É só clicar no Play

PARTE II
PARTE III

4/08/2011

O HOMEM MIGRANTE / D. Lapoujade


Imagem: Paulo Ponte Souza








Por David Lapoujade

Conhecemos os provincianos por seu modo de conhecimento... tem pessoas que não mudam, não querem mudar seu conhecimento... O HOMEM MIGRANTE ESTÁ ENTRE OS CONHECIMENTOS QUE ELE ABANDONA E AQUELES CONHECIMENTOS QUE NÃO ADQUIRIU AINDA... É governado pela pergunta. ELE HABITA O INTERVALO. O conhecimento MIGRATÓRIO lida com os SEGREDOS (aquilo que está por trás de uma pessoa). Qual o segredo? O que faz migrar? O poder de sedução de um segredo! Emissão de signos secretos que estão em volta dos segredos. Simpatia por... É o que move alguém a conhecer. CONHECIMENTO MIGRATÓRIO é uma relação afetiva, de simpatia. É conhecer o que passa no interior e considerar o segredo uma interioridade que me escapa... um mundo  diferente do meu. Alinhando os afetos, posso ser um outro através do outro. Torno-me um outro por meio de outra pessoa. Nunca migramos sozinhos, sempre há alguém que simpatizamos. Conhecemos por intermédio do outro. Não me fusiono com esse outro, mas me torno um outro por meio dele e o outro se torna um outro por meu intermédio. Afetação. Uma ordem rítmica. Reencontrar o ritmo de outrem. Não conhecemos o outro por sua história, mas PELOS MOVIMENTOS QUE ELE PODE FAZER. Para CONHECER, o verbo é SEGUIR (algo que se produz). É a tonalidade, o tom, do outro em mim, não vibrando em uníssono, mas em eco. Por isso, seguir para conhecer. Simpatia, colocar-se no mesmo nível, mesmo plano do outro, comum entre nós, onde podemos nos compreender, um ritmo comum, mesma tonalidade, mesmo tom? Em que registros o outro está atuando? Atmosfera... Que tonalidade você viveu sua vida? (Os celibatários de Henry James e o sistema do tarde demais...). O outro é um segredo. Tentar saber qual é o segredo. Qual é o ponto de vista que está atrás do enunciado? Para saber precisamos reunir outros signos... a partir de mim, em que nível em mim, há a variação de... Conhecer é traçar linhas em ziguezague, deambulantes, que ligam e podem criar novas realidades, novas verdades. A TRANSFORMAÇÃO SEMPRE VEM DO EXTERIOR E NUNCA DO INTERIOR...
SE DÁ PELA AFETAÇÃO EXTERIOR.”

David Lapoujade, SESC/SP- 2009