1/29/2024

OS ANOS 1930 ESTÃO DIANTE DE NÓS | Giorgio Agamben

 


                                                                Gérard Granel




Os anos 1930 estão diante de nós


Giorgio Agamben

Tradução: Claudio Oliveira

 


Em novembro de 1990, Gérard Granel, uma das mentes mais lúcidas da filosofia europeia daqueles anos, realizou uma conferência na New School for Social Research, em Nova Iorque, cujo título, certamente significativo, não deixou de provocar algumas reacções escandalizadas entre os bem-pensantes: os anos trinta estão diante de nós. Se a análise feita por Granel era genuinamente filosófica, as suas implicações políticas eram de fato imediatamente perceptíveis, pois em questão, no sintagma cronológico aparentemente anódino, estavam pura e simplesmente o fascismo na Itália, o nazismo na Alemanha e o estalinismo na União Soviética, ou seja, as três tentativas políticas radicais de «destruir e substituir por uma nova ordem aquela em que a Europa até então se reconhecia». Granel conseguiu mostrar como a classe intelectual e política europeia tinha sido tão cega frente a essa tripla novidade como o foi – na década de 1990 como hoje – frente ao seu inquietante, mesmo se alterado, ressurgimento. É difícil acreditar que Leon Blum, líder dos socialistas franceses, pudesse declarar, comentando as eleições alemãs de julho de 1932, que, diante dos representantes da velha Alemanha, «Hitler é o símbolo do espírito de mudança, renovação e revolução» e que, portanto, a vitória de von Schleicher lhe teria parecido «ainda mais desoladora que a de Hitler». E como julgar a sensibilidade política de Georges Bataille e André Breton, que, face aos protestos contra a ocupação alemã da Renânia, puderam escrever sem vergonha: «em qualquer caso, preferimos a brutalidade anti-diplomática de Hitler, mais pacífica, na verdade, do que a excitação decrépita de diplomatas e políticos.” A tese deste ensaio, cuja leitura recomendo fortemente, é que o que define o processo histórico em curso, nos anos 1930 assim como nos anos 1990 em que escrevia, é a mesma primazia do infinito sobre o finito, que, em nome de um desenvolvimento que se pretende absolutamente ilimitado, procura abolir em todos os âmbitos - econômico, científico, cultural - as barreiras éticas, políticas e religiosas que o tinham até então de alguma forma contido. (continua nos comentários) E, ao mesmo tempo, também através dos exemplos do fascismo, do nazismo e do estalinismo, Granel mostrou como um processo semelhante de infinitização e mobilização total de todos os aspectos da vida social só pode levar à autodestruição.

Sem entrar no mérito desta análise certamente persuasiva, interessa-me aqui sublinhar as analogias com a situação que estamos atravessando. Com a diferença, talvez, de que os sinais de cegueira, de ausência de pensamento e de uma provável e iminente autodestruição, que Granel evocava, se multiplicaram vertiginosamente. Tudo faz pensar que estamos entrando - pelo menos nas sociedades pós-industriais do Ocidente - na fase extrema de um processo cujo fim não pode ser previsto com certeza, mas cujas consequências, se a consciência dos limites não despertar novamente, poderão ser catastróficas. Que os anos 30 do século XX ainda estejam diante de nós não significa que vejamos os acontecimentos aberrantes em questão ocorrerem hoje exatamente da mesma forma; antes, significa o que Bordiga pretendia expressar ao escrever, após o fim da Segunda Guerra Mundial, que os vencedores seriam os executores testamentários dos vencidos. Os governos em todo o mundo, independentemente da sua cor e posição, atuam como executores de um mesmo testamento, aceito sem benefício de inventário.  Por todos os lados vemos continuar cegamente o mesmo processo ilimitado de incremento produtivo e desenvolvimento tecnológico que Granel denunciava, no qual a vida humana, reduzida à sua base biológica, parece renunciar a qualquer outra inspiração que não seja a vida nua e se mostra disposta a sacrificar-se sem reservas, como vimos nos últimos três anos, a sua própria existência política.

15 de janeiro, 2024

 

Publicado em:

https://www.quodlibet.it/giorgio-agamben-gli-anni-trenta-sono-davanti-a-noi

 


1/26/2024

Colóquio «Dário Azevedo: uma poética da amizade»

  


 


 

PELA AMIZADE

Nilson Oliveira

 

 

Uma vida repleta de encontros, essa foi a aventura de Dário Azevedo no transcurso de uma experiência, entre aulas, pensamentos, situações de uma vida intelectual, com os olhos acesos às erosões e também aos ruídos do presente, sempre num contrafluxo, com a singularidade e a elegância que lhe foi própria. Dário transitou pela sociologia e pela psicanálise, foi leitor de Foucault, fez canções, escreveu poemas, ensaios, dirigiu (com Denys Costa & Raoni Figueredo) um filme sobre «sujeitos homoafetivos velhos».

As movimentações em torno deste colóquio anseiam uma homenagem a Dário Azevedo, prof. da UFPA, que nos deixou em 2021, vítima da Covid-19.

Desse modo, durante essas conversações, evocaremos o seu lastro a fim de evidenciar, no contemporâneo, uma presença que foi (e permanece sendo) sobretudo fluxo e suavidade. Trata-se de uma confluência de afetos, com base em elaborações diversas, na direção da amizade, cujo motivo principal é a ideia de encontrar e pensar com Dário. Convergência de pensamentos e experimentações a partir de movimentações distintas, numa polissemia de vozes, em philia, ecoando pelo seu horizonte no mais suave avizinhamento.

 

 

 

C O L Ó Q U I O

«DÁRIO AZEVEDO:

UMA POÉTICA

DA AMIZADE»


De 01 a 02 de dezembro de 2023

Local: IPHAN / Belém (PA).

Av. José Malcher,  474. 

Informações: revista.polichinello@gmail.com

 

 

P R O G R A M A Ç Ã O

 

01 DE DEZEMBRO 2023

 

17h. Exibição do filme:

"Velhos Sujeitos Outros Transgressivos"

Direção: Dário Azevedo, Denys Costa, Raoni Figueredo.

 

18h30. Abertura: Nilson Oliveira (Revista Polichinello)

"Pela amizade"

 

19h. Henry Burnett (Unifesp)

"Antes o Riso"

 

19h30. Josi Maués (Ufpa)

Apresentação ...

 

20h. Claudia Gomes (Ufpa),

Ana Lúcia Dias (Ufpa)

Márcia Lopes (Ifpa)

"Entre Salvamento e Estado de Bonequice"

 

20h30. Caio Tobit (Músico & Compositor)

"Aquário" (vídeo)

"Carta ao Pai" (vídeo)

 

 

02 DE DEZEMBRO 2023

 

17h. Flávio Valentin (Seduc)

"O Sócrates Negro"

 

18h. André de Aquino (Unicamp)

"De uma Certa Possibilidade Impossível

de Dizer a Amizade"


19h. Sérgio Bandeira (Ufpa)

"Retalhos de Escrituras,

Memórias e Afetos"

 

19h30. Carlos Paixão (Ufpa)

"Esboço de Vida"