1/17/2012

(Não) Escrever mais








Não escrever – que longo caminho antes de chegar a tal ponto, e isso não é jamais seguro, não é nem uma recompensa nem um castigo, é preciso somente escrever na incerteza e na necessidade. Não escrever, efeito de escrita; como uma marca da passividade, um recurso da desgraça. Quantos esforços para não escrever, para que, escrevendo, eu não escreva, apesar de tudo - e finalmente eu cesse de escrever, no momento último da concessão; não no desespero, mas como o inesperado: o favor do desastre. O desejo não satisfeito e sem satisfação e, entretanto, sem negativo. Nada de negativo em « não escrever », a intensidade sem maestria, sem soberania, a obsessão do totalmente passivo.

Desfalecer sem falta: marca da passividade.

Querer escrever, que absurdo: escrever é a decadência do querer, como a perda do poder, a queda da cadência, o desastre ainda.


Não escrever: a negligência, a incúria não são suficientes para isso; a intensidade de um desejo fora da soberania talvez - uma relação de submersão com o fora. A passividade que permite se manter na familiaridade do desastre.

Ele põe toda sua energia para não escrever, para que, escrevendo, escreva por desfalecimento, na intensidade do desfalecimento.

Que as palavras cessem de ser armas, meios de ação, possibilidades de salvação. Reportar-se ao desconcerto.

Quando escrever, não escrever, é sem importância, então a escrita muda – que ela tenha lugar ou não, é a escrita do desastre.

Não confiemos no fracasso: seria ter a nostalgia do êxito.

Para além da seriedade, há o jogo, mas para além do jogo, procurando aquilo que engana o adversário: o gratuito, ao qual não se pode se esquivar, o casual sob o qual tombo, sempre já tombado.

Ele passa dias e noites no silêncio. É a palavra, isso.













2 comentários:

  1. "Querer escrever, que absurdo: escrever é a decadência do querer, como a perda do poder, a queda da cadência, o desastre ainda." Nilson de Oliveira.
    "uma relação de submersão com o fora." Nilson de Oliveria. E maioria dos escritores que encontro estão dentro. Felizes em meio aos entes. Profissionais fincados neste mundo, como qualquer estilista, socialite, celebridade. Outra do Cioran: "Prefiro um porteiro inquieto, a um filósofo seguro de si." E o mundo cultural, tb uma indústria, me parece um ninho de gente com certezas e mais certezas. Minha mãe, extremamente católica, costuma dizer que, se Cristo voltasse hoje, seria crucificado outra vez pelos que se dizem seus fiéis. Digo o mesmo quanto a Kafka, se voltasse hj, seria relegado ao limbo pelos seus próprios leitores.Por falar em leitores e o que vc pensa sobre a leitura?
    Abração,

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  2. *estou neste dilema. era isto que eu queria dizer para meus dias. estou em des(graça) e escrevo porque queria chegar ao ponto de não precisar mais escrever. chegar ao ápice. e silenciar. mas lá, neste silêncio, é muito longe para mim. ainda. um abraço.

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