10/17/2013

Anti-Retratos │ por Alberto Pucheu


Imagem: Gil Maciel: http://cargocollective.com/gilmaciel#Cartazes
 


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Anti-Retratos │ por Alberto Pucheu
 

Não autorizo de modo algum que algum usurpador em mim escreva minha autobiografia. Quem quiser que faça minha autobiografia sem autorização prévia. Só não diga depois que é minha. Tudo de que alguém em mim pode se apropriar em mim não me interessa. Só me interessa o que alguém em mim pode escrever para me livrar de mim. E, em defesa de minha privacidade, não abro mais a boca, porque vivo traindo o que nem sei de mim em mim, e tudo que falo de mim me torna, na fala, público, passível de ser uma autobiografia já feita por algum usurpador de mim.
 
 
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Biografias de quem? Possuir na escrita a vida de alguém? Quem sente sua vida tomada por uma biografia? Em que medida uma vida é possuída? Que autoria ou autoridade se tem sobre uma vida? Quem é esse - o poeta?

“O poeta é fora de si” – Platão

 “[O poeta] não tem identidade” – Keats

 “Se então [o poeta] não tem um si mesmo, e se eu sou um Poeta, onde estaria a Surpresa se eu dissesse que eu não escreveria mais?” - Keats

 “É algo vergonhoso confessar: é um fato certo que nenhuma palavra que jamais pronunciei pode ser tomada como uma opinião nascida de minha própria natureza – como poderia ser, se não tenho nenhuma natureza?” – Keats

 “Se os velhos imbecis tivessem descoberto algo mais que a falsa significação do Eu, não teríamos de varrer esses milhões de esqueletos que, desde um tempo infinito, vêm acumulando os produtos de sua inteligência caolha, arvorados em autores! [...] Porque Eu é um outro. Se o cobre acorda clarim, nenhuma culpa lhe cabe. Para mim é evidente: assisto à eclosão de meu pensamento: eu a contemplo, eu a escuto” – Rimbaud

 ”Hoje, já não tenho personalidade: quanto em mim haja de humano, eu o dividi entre os autores vários de cuja obra tenho sido o executor. Sou hoje o ponto de reunião de uma pequena humanidade só minha” – Fernando Pessoa

“A origem mental dos meus heterônimos está na minha tendência orgânica e constante para a despersonalização” – Fernando Pessoa

 “A escrita é destruição de toda a voz, de toda a origem. A escrita é esse neutro, esse compósito, esse oblíquo para onde foge o nosso sujeito, o preto-e-branco aonde vem perder-se toda a identidade, a começar precisamente pela do corpo que escreve” – Roland Barthes

 “Na escrita [...] não se trata da amarração de um sujeito em uma linguagem: trata-se da abertura de um espaço onde o sujeito que escreve não para de desaparecer [...] a marca do escritor não é mais do que a singularidade de sua ausência: é preciso que ele faça o papel do morto no jogo da escrita” – Michel Foucault

 “Se chamarmos o gesto o que continua inexpresso em cada ato de expressão, poderíamos afirmar então que, exatamente como o infame, o autor está presente no texto apenas em um gesto, que possibilita a expressão na mesma medida em que nela instala um vazio central [...] Sua vida é apenas jogada, nunca possuída, nunca representada, nunca dita – por isso ela é o lugar possível, mas vazio, de uma ética, de uma forma de vida [...] O autor é o ilegível que torna possível a leitura, o vazio lendário de que procedem a escritura e o discurso” – Giorgio Agamben.
 
 
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Alberto Pucheu / Poeta e professor de Teoria Literária da UFRJ (pesquisador do CNPq) autor de diversos livros de poesia e teoria, sendo o mais recente A fronteira desguarnecida (poesia reunida 1993-2007), e Pelo colorido, para além do cinzento – A literatura e seus entornos interventivos, ambos pela Azougue Editorial, 2007.








 
 
 
 
 
 
 

 

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