5/11/2012

ESCREVER POR AUSÊNCIA









Temos constantemente necessidade de dizer (de pensar): chegou-me aí alguma coisa (de muito importante), o que quer dizer ao mesmo tempo, isso não saberia ser da ordem do que chega, nem da ordem do que importa, mas, antes, exporta e deporta. A repetição.







Entre certos « selvagens » (sociedade sem estado), o chefe deve provar sua dominação sobre as palavras: nenhum silêncio. Ao mesmo tempo, a palavra do chefe não é dita para ser escutada – ninguém presta atenção à palavra do chefe, ou antes, finge-se a desatenção; e o chefe, efetivamente, não diz nada, repetindo como que a celebração das normas de vida tradicionais. A qual demanda da sociedade primitiva responde essa palavra vazia que emana do lugar aparente do poder? Vazio, o discurso do chefe o é justamente porque é separado do poder – é a sociedade ela mesma que é o lugar do poder. O chefe deve se mover no elemento da palavra, quer dizer, no oposto da violência. O dever de palavra do chefe, esse fluxo constante de palavra vazia (não vazia, tradicional, de transmissão) que ele deve à tribo, é a dívida infinita, a garantia que interdita ao homem de palavra devir homem de poder.








Há questão, e, entretanto, nenhuma dúvida; há questão, mas nenhum desejo de resposta; há questão, e nada que possa ser dito, mas somente a dizer. Questionamento, colocação em causa que ultrapassa toda possibilidade de questão.








Aquele que critica ou repele o jogo, já entrou no jogo.








Como se pode pretender: « O que tu não sabes de maneira alguma, de maneira alguma saberia te atormentar? » Não sou o centro daquilo que ignoro, e o tormento tem seu saber próprio que recobre minha ignorância.








O desejo: faça com que tudo seja mais que tudo e permaneça o tudo.



Escrever pode ter ao menos esse sentido: usar os erros. Falar os propaga, os dissemina fazendo crer numa verdade.








Ler: não escrever; escrever na interdição de ler.








Escrever: recusar escrever - escrever por recusa, de sorte que seja suficiente que se lhe peça algumas palavras para que uma espécie de exclusão se pronuncie, como se se o obrigasse a sobreviver, a se prestar à vida para continuar a morrer. Escrever por ausência.




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Um comentário:

  1. Anônimo14:55

    maravilhoso o texto, nilson!! muito bom mesmo!!! excelente. parabéns!! abração, alberto

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